segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Abrunheira = Brasil

Sabe que a Abrunheira é também conhecida por Brasil e os seus habitantes, como não podia deixar de ser, por brasileiros?
O Silvestre Félix explica-nos porquê.
PORQUE NOS ALCUNHARAM DE "BRASILEIROS"
Já se vai ouvindo cada vez menos, mas ainda se diz uma ou outra vez, e sempre da boca de pessoas mais velhas que eu, referindo-se à Abrunheira como "Brasil". Pois é, o que teremos a ver com o Brasil…
O feito dos nossos heróis, Gago Coutinho e Sacadura Cabral, saindo de Lisboa no hidroavião "Lusitânia" em 30 de Março de 1922, fazendo a rota do Atlântico Sul e chegando ao Rio de Janeiro no Hidroavião Santa Cruz a 17 de Junho de 1922, teve um alarido muito grande em todo o País. Era uma época em que os valores e a auto-estima estavam de rastos por cá (onde é que já ouvi isto??), e então, um feito destes, sim porque esta viagem dos dois Portugueses, foi um marco muito importante na evolução da aviação civil entre os dois continentes, era suficiente para dar ânimo e esperança a esta Gente.
Na Abrunheira o acontecimento também foi vivido com o entusiasmo inerente. Foi de tal forma que houve quem quisesse imitar os Heróis Nacionais.
Um dos protagonistas, não me lembro do nome mas lembro-me da pessoa, morava num casal onde é hoje a rua da escola , em frente à Rua de S. José. Acho que era família do Mário Martinho. De quem me lembro bem era do "Coutinho" marido da Judite Caracol. Ora a quinta do Caracol Velho (que fumou cachimbo até morrer muito Velho) era quando se desce a Rua Humberto Delgado, a seguir à Quinta do Azevino do mesmo lado. Pois o Coutinho, genro do Caracol Velho, era homem de músculos. Por mais de uma vez, na taberna do Faial, hoje da Viuva e Filha Isabel do António José, que morreu há relativamente pouco tempo, por mais de uma vez, dizia eu, este homem, que se chamava Coutinho igual ao Herói que voou com o Sacadura até ao Brasil, levantou com os dentes um barril de vinho de 50 litros. Este Coutinho ainda me lembro de o ver, de picareta nas unhas (mãos) a abrir valas para a colocação da água canalizada que vinha aí à pressa, pois já estava atrasada, mas finalmente quase a chegar à Abrunheira.. Era um homem forte até começar, à medida que O tal Tempo, a curvatura do peso do (outra vez) Tempo contado em anos de idade, que começaram a ser muitos, e também me lembro de ver este Coutinho arrastando os pés pesados pelo Tempo que passou.
Quando ainda eram fortes, lá por alturas de 1922/23, e como também queriam ser heróis, o Coutinho e o Outro (que me desculpem a ida da memória) construíram como puderam, e com a ciência que a vivência lhes deu, um avião à semelhança do "Lusitânia" mas aí com um terço do tamanho ou menos, para poderem utilizar como rampa de lançamento um "zambujeiro" (parente pobre da oliveira) aqui por cima das "pateiras". Claro que a rampa de lançamento não foi suficiente para que o Coutinho e o Outro conseguirem concretizar o seu sonho… voar como faziam os pombos, as rolas, os melros, sim… porque o Lusitânia ou qualquer outro avião eles nunca viram, daí acreditarem que bastava construírem uma coisa com asas para poderem levantar voo e irem até ao Brasil, que a vivência lhes dizia que era já ali. Pois é, o trambolhão foi instantâneo, assim que fizeram peso no "hidroavião" em cima do zambujeiro, caíram com os quatro costados no chão e assim se acabou a viagem até ao Brasil.
Mas se aqui acaba a história do voo até ao Brasil para o Coutinho e para o Outro, também aqui começa outra história. À conta deles, e como havia espectadores, os de Albarraque, Linhó, Mem Martins e doutras terras ainda mais longe, em jeito de chacota, começaram a chamar-nos "Brasileiros" e à Abrunheira "Brasil". Por acaso já repararam que o café na Av. Dos Combatentes, em frente ao Trilho se chama "Brasil"? e sabem porquê ? Exactamente…, por causa da história do Coutinho e do Outro. Na época da inauguração do Café Brasil pelo "Manel do café" genro do autêntico Saloio "Sabino" homem grande que fazia dois de mim, e que tinha tanto de grande como de bom. Usava barrete, aquele barrete preto à Saloio, e aqueles calças de cetim que apertavam até por cima da barriga com a devida saliência, e também aquelas camisas que hoje só costumamos ver nos trajes dos ranchos folclóricos…. Voltando ao fio da inauguração do café, estava-mos lá pra 1964/65/66 (tenho que lembrar que eu e O Tempo que passa não nos damos lá muito bem) e naquela época ainda era normal nos arredores chamarem mesmo "Brasil" à Abrunheira e a nós, os de cá "Brasileiros".
Sil Félix